O café, produzido em mais de 70 países, é uma das bebidas mais consumidas no mundo. No Brasil, seu consumo chegou a 21,5 milhões de sacas por ano em 2021.
Ao longo das últimas décadas, no entanto, o grão tem sido alvo de muitas controvérsias científicas sobre os efeitos de seu consumo frequente na saúde. De vilão a herói, mitos e benefícios do café passaram por reviravoltas e, para entender o que realmente se sabe sobre seus efeitos, é importante analisar o que dizem estudos científicos e especialista
O café já chegou a ser associado ao aumento do risco de câncer, especialmente por conter acrilamida, uma substância química formada em determinados alimentos ricos em carboidratos quando são cozidos e processados em altas temperaturas.
A relação com o câncer gerou preocupações, mas a Organização Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) concluiu, em 2016, que o café não é carcinogênico, a não ser quando consumido em temperaturas extremamente altas (ou seja, temperaturas que ultrapassem 65°C).
E, embora o café contenha acrilamida, estudos recentes não encontraram evidências substanciais que provem a conexão entre o consumo de café e o risco de câncer. Aliás, alguns estudos provam o exato oposto.
O café também já foi visto como um possível vilão para a saúde cardíaca, porque o efeito da cafeína no sistema nervoso central é estimulante e tem o potencial de elevar momentaneamente a pressão arterial.
Mas o que a ciência tem mostrado é diferente: o efeito da cafeína sobre a pressão arterial é passageiro e não seria suficiente para constituir-se como estímulo a uma condição permanente.
Além disso, um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Southampton, no Reino Unido, e publicado em 2017 na revista Annals of Internal Medicine analisou os hábitos de consumo de café de mais de meio milhão de europeus ao longo de 16 anos, com foco em suas associações com a mortalidade por diversas causas, incluindo doenças cardíacas, AVC e câncer.
O estudo concluiu que pessoas que afirmavam consumir até quatro xícaras de café por dia apresentavam um risco menor de mortalidade por doenças cardíacas, AVC e câncer.
Embora tenha imprecisões (como os demais fatores presentes entre a população analisada que podem explicar uma tendência menor às doenças e não necessariamente relacionam-se ao café), o estudo sugere que o café pode ser inofensivo às condições cardiovasculares.
Uma outra pesquisa, publicada pelo Instituto Politécnico de Bragança, se dedicou a revisar outros dois artigos e mais 11 estudos observacionais e concluiu que o café pode melhorar condições cardiovasculares e representar um menor risco de doenças coronarianas.
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Embora muitas pessoas se considerem "viciadas" em café, a dependência de cafeína é, na maioria das vezes, uma forma de dependência leve, que não pode ser comparada a outros tipos de dependência química.
Os sintomas de abstinência, como dor de cabeça e cansaço, são comuns, mas raramente atingem o nível de um vício.
Para a maioria das pessoas, o desconforto da falta de café não chega a ser mais do que uma irritação passageira.
Mas e quanto aos benefícios do café?
Apesar de existirem algumas controvérsias a respeito das propriedades "protetivas" do grão, estudos observacionais têm mostrado uma associação entre o consumo de café e a redução do risco de vários tipos de câncer, incluindo os cânceres de fígado e cólon.
Por ser rico em antioxidantes, compostos que ajudam a combater os danos causados pelos radicais livres no corpo, o café poderia ser benéfico ao organismo na proteção contra esses tipos de câncer.
Uma pesquisa da Universidade de Wageningen, na Holanda, indicou que pacientes com câncer colorretal que consumiam até quatro xícaras de café por dia tinham 32% menos chances de recidiva da doença em comparação com aqueles que bebiam menos de duas xícaras.
Já um estudo publicado no BMC Public Health revelou que o consumo de café pode reduzir significativamente o risco de doenças hepáticas crônicas e a mortalidade associada a elas, que incluiria o risco de câncer de fígado. Os pesquisadores acompanharam 494.585 participantes do UK Biobank ao longo de quase 12 anos e concluíram que beber café estava associado a uma diminuição do risco de doenças hepáticas.
Por atuar bloqueando os receptores de adenosina no cérebro, o que resulta em uma maior atividade neural e liberação de neurotransmissores, como a dopamina e a norepinefrina, o café está levemente associado a uma melhora no foco e na concentração.
O grão é considerado psicoativo, mas seu consumo regular pode fazer com que o organismo se torne tolerante aos efeitos da cafeína, o que significa uma redução desses benefícios.
Uma pesquisa da Universidade de Tsukuba, no Japão, revelou que um composto chamado trigonelina, encontrado no café, demonstrou melhorar os níveis de aprendizado e de memória de curto prazo em pesquisas com animais.
Isso sugere que o café pode ser benéfico não apenas para a atenção, mas também para a reter informações.
Além disso, no longo prazo, o café pode estar associado a um menor risco de doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson. Os fenilindanos, compostos formados durante a torrefação do café, podem inibir o acúmulo de proteínas tóxicas no cérebro que estão ligadas ao declínio cognitivo.
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É importante lembrar, no entanto, que a qualidade do grão de café consumido também é importante na hora de avaliar os benefícios da bebida.
Essa qualidade é medida, principalmente, pelo tipo de torrefação, que afeta diretamente o sabor, a acidez e aparência do café.
Apenas as torras controladas são capazes de realçar as características boas do café, como os ácidos clorogênicos, que têm propriedade antioxidante e ajudam no combate de radicais livres e potencialmente tóxicos no organismo.